terça-feira, 13 de setembro de 2016



                                                                      Episódio 20




No Episódio Anterior

                De repente, Liana girou o disparador no ar e apertou a tecla de disparo. A centelha desprendeu-se, o dardo atingiu o Supervisor no rosto. Ela continuou pressionando a tecla, repetidamente, liberando uma descarga depois da outra. O Supervisor perdeu os sentidos e desabou no assoalho, tremendo convulsivamente.



A HORA DAS SOMBRAS

de Luiz Antonio Aguiar

(episódio final)

                Os blindados do Operacional Unificado dos Condomínios conseguiram, afinal, cercar o veículo pilotado por Bazu. Um dos helicópteros de combate baixava sobre ele, levantando poeira, para cegá-lo. Uma descarga descomunal de projéteis foi disparada contra o veículo, praticamente destruindo- o. Pouco restava da carcaça metálica.
                - Parem de gastar munição! – soltou a mensagem, o helicóptero. – Ele está fora de combate. Deve ter virado torresmo dentro dessa lata velha!
                De fato, os veículos enviados pela segurança do condomínio eram muito mais modernos e bem equipados que os utilizados pelas delegacias. E, fosse como fosse, o alvo já não respondia aos disparos.
                - Precisamos conferir! – retrucou, também pelo comunicador, o comandante da força terrestre. E deu ordem para que um grupo abordasse o veículo abatido.
                O helicóptero parou a cerca de dez metros de altura, bem em cima do blindado, dando cobertura.
                - Ele não pode estar vivo, cara! – disse o piloto, rindo, no comunicador.
                O metal da carcaça externa do veículo de Bazu estava muito quente. Equipados com luvas e roupas especiais, os homens do Operacional  o escalaram e, no topo, abriram a escotilha. Um dos seguranças pulou dentro do blindado e foi só então que enxergou o buraco na lateral interna da cabine, por onde Bazu escapara.

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                -  Tem muita fumaça aqui dentro. Não estou enxergando direito, mas acho que... aquele desgraçado...! Atenção...!
                As palavras do segurança foram cortadas por uma explosão que praticamente pulverizou o que restava do veículo e os homens lá dentro, tanto os que havia entrado nele como os que estavam no topo, junto da torre. Bazu com certeza sabia armar uma bomba de maneira a não deixar sobreviventes.
Mas, o efeito foi maior do que ele imaginara, já que estilhaços de metal foram projetadas, como se fossem arpões contra o helicóptero, acima do blindado, perfurando sua fuselagem.
                O aparelho debateu-se no ar, tentando evitar a queda, mas já havia virado uma bola de fogo descontrolada, enquanto o piloto berrava:
                - Vamos cair! Minha nossa! Vamos morrer!
                O helicóptero despedaçou-se sobre dois blindados da força do Operacional Unificado dos Condomínios, causando outra explosão que matou todos os seus ocupantes. Outros blindados em volta foram atingidos pelos destroços, transformados em perfurantes projéteis incandescentes. Os seguranças os abandonavam, em pânico, expulsos pelo calor.
                - Vai tudo explodir! – gritaram alguns, enquanto uma nuvem de poeira fervente e vapor de lama derretida elevava-se, queimando lábios, interior da boca, gargantas, traqueias, pulmões.
                Bazu saltou de dentro de  um prédio, onde se ocultara. Jogou fora o controle remoto que detonara a arapuca em seu blindado e engatilhou a metralhadora.
                - Você queria ter estado comigo, garoto? Naqueles dias, não queria? Quando a gente atirava para tudo que é lado, e os idiotas só caíam. Como se fossem feitos de papelão. Vamos lá, garoto. Você está comigo agora! Mate! Mate!
                Bazu penetrou na fumaça ardente. Sua metralhadora crepitava. Os seguranças tentavam responder aos tiros, sem enxergar nada em volta, e atingiam uns aos outros, enquanto o policial continuava atirando em qualquer vulto que se mexesse.
                Poucos sobraram vivos. Nenhum sem ferimentos. Bazu tombou depois de levar repetidos balaços. Primeiro caiu de joelhos. E continuou atirando. Atingido mais vezes, rindo alto, ainda atirava, quando finalmente a vida escapou dele e o policial caiu de cara no chão. Até o último momento, cantava a toda altura: “Nós somos a Grande Dupla!”.

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                Já o Supervisor, somente foi se inteirar da catástrofe muitas horas depois. Despertou com a manhã avançada, na sua suíte, com o corpo dormente e muita dor de cabeça.
Enquanto ele estivera fora do ar, a Matriz, alertada imediatamente do conflito entre policiais, tentou uma reunião on-line de emergência com os supervisores dos três condomínios. O executivo encarregado do Fortificado Atlântica Sereia não compareceu. Seus subordinados informaram que ele havia sido “vitimado” por uma A1, num apartamento privado, anexo aos seus aposentos, na cobertura executiva. Era o que poderiam dizer. E que se encontrava desacordado, sob cuidados médicos.
A Matriz não aprovou que o Supervisor tivesse se ausentado no meio de uma guerra entre as forças policiais  sob a sua administração, que na verdade se transformou numa conflagração geral, com represálias de todos os lados e uma escalada fora de controle nos enfrentamentos.
Na reunião, os executivos presentes responsabilizaram o Supervisor do Atlântica Sereia pelos acontecimentos (“Se providências imediatas e eficazes tivessem sido tomadas, sem demora...”) Já nesse momento era oficial a sua transferência para a Região Afastada 7. E rebaixado para o posto de gerente de serviços de entrega. Iria dirigir o DÊ-SEX de lá, sem direito a fazer aquisições próprias. O ex-Supervisor não teve oportunidade de responder às acusações. Da cama, foi colocado imediatamente no helicóptero que o levaria para o aeroporto e, dali, para a Região Afastada 7, num continente onde ninguém desejaria trabalhar, e com “nativos” diante dos quais não teria de fingir para que suas ordens soassem com  sotaque estrangeiro.
Foi toda essa confusão que salvou Chokita. Se o Supervisor ainda fosse supervisor, descontaria nela parte da sua raiva. Como não tinha mais autoridade para isso, a garota passou várias semanas esquecida na suíte A3, com todo o conforto, até ser reencaminhada para o harém.
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“É só uma história...”... Úgui jamais esqueceria o afago do velho CÊ-Dê quando se despediram. Lamentou que o velho não quisesse ir com eles. “Uma história que os funcionários contam.”
- Tenho minha toca na Zona Norte – disse... – Uma casinha. Um lugar seguro. Ninguém vai lá. Ninguém acha que tem nada lá. Eu me preparei para uma situação como essa. Mas, vocês... Se for verdade, sigam com cuidado a orla marítima, passando pela Zona dos Condomínios, e continuem. Vai ter uma reserva florestal imensa. E uns pântanos. Tudo abandonado. Cuidado com os jacarés por lá. Não, não estou brincando. Explico depois o que são jacarés... Então, se forem até bem longe, vão encontrar umas fazendas. Um pessoal que morou aqui na cidade, no passado. Os cretinos daqui não se interessam por eles, a não ser como fornecedores de ovos, queijo, verduras... É de onde vem muita coisa que os executivos gostam de ter na mesa. Hoje são artigos de luxo. Mas já se vendeu tudo isso em feiras, nas ruas... Em lojas... Não importa. Lá, vocês vão ficar sabendo de tudo isso. E tem lugar para vocês,  se quiserem trabalhar e  viver em paz. Ninguém daqui perturba esse pessoal. Precisam deles. Ora, é somente uma história... Mas, repetem tanto. Pessoas diferentes, com detalhes. Mas, sempre a mesma história. Não pode ser mentira, não. Tem alguma coisa lá. Daí, quem sabe? Se for isso mesmo... Bem, pode ser bom para vocês. Se eu fosse mais moço... Vão!  Para vocês, vale a pena tentar.
Apenas uma história. E Úgui era bom para contar histórias. Era uma das qualidades necessárias a um chefe de bando, contar histórias. Por isso, mesmo não sabendo direito o que iriam encontrar, soou bastante convincente diante do seu antigo bando. Decidiram acompanhá-lo. Liana também. A história devolveu o sorriso ao rosto dela. Os dois de braços dados, ele ajudando a carregar as sacolas de livros que ela trouxera, e lá foram,  seguindo uma história. Somente uma história. Mas, lá iam eles.
No que derrubou o Supervisor, Liana correu para Úgui. Deteve-se a um passo dele, sem tocá-lo. Ele a fitou. Estavam assustados. O garoto ainda teve dificuldades para se por em pé. As pernas tremiam. Pareciam que não iam sustentá-lo. O corte em sua garganta voltara a sangrar. Mas, não tirava os olhos dela. Quando ela estendeu a mão para ele, Úgui a puxou para si. E se abraçaram.
- Tem um velho... esperando por nós. Pode nos tirar daqui. Mas, vai embora logo.
Liana assentiu de cabeça, compreendendo o que deveria fazer. Ou melhor, decidindo o que iria fazer a seguir, apesar dos protestos de Úgui. Ela correu para arranjar sacolas, na despensa, e depois começou a enfiar os livros encadernados dentro delas.
- O que você está fazendo, sua doida? Essa sua mania de catar porcaria! Liana! A gente não tem tempo para isso!
- Meu pai ... – murmurou a garota, para espanto de Úgui. – Meu pai morreu. Esses livros são ele. Para mim. Dele para mim!
Úgui sabia que não tinha tempo para ficar espantado. Respirou fundo e então foi auxiliá-la a juntar os livros. Havia muitas coisas que não sabia sobre Liana. Muitas coisas que ele queria conhecer.
- Seu pai... de verdade? Como antigamente? Você viveu com um... pai?
Liana obrigara Úgui a virar de costas enquanto ela tirava a blusa de seda e vestia as roupas com que tinha chegado no Condomínio. Depois, passou no banheiro para lavar a maquiagem e soltar os cabelos. Tudo isso com ignorando mais protestos de Úgui.
- O velho é meio maluco. Conta umas histórias, não sei... Pode ser que seja verdade. Mas, ele não vai ficar esperando para sempre. Vamos, Liana! Por favor! Se apressa, tá?
                Cê-Dê os conduziu no seu carro velho até o shopping, onde estava o bando. E foi aí que se despediram. Já havia blindados da polícia levando a guerra à Via Expressa. Na confusão, Úgui conduziu  o seu bando, à noite, para se esgueirarem pela orla, junto à rodovia, fora do alcance do sistema de segurança – que, fosse como fosse, fora danificado pelos combates e funcionava apenas precariamente.
                Num dado momento, já a boa distância dos condomínios, quando alcançaram o alto de um morro, Úgui se deteve, observando todo o bando, que o seguia. Todos com muita esperança. Estava satisfeito consigo mesmo por ter voltado para pegá-los. Sentia que era o tinha de fazer. Que era o certo. Mas, tinha medo. As histórias que contara ao bando...
                - E se não tiver nada lá? – segredou para Liana, indicando uma planície e o horizonte ao longe.
                - Vai ter! – disse Liana. – Vai ter a gente, não vai?
                Úgui assentiu, confortado. Talvez, Liana tivesse razão. Talvez, tivesse chegado a hora deles. A hora de viver num mundo do qual não fossem apenas sombras.          
               


FIM


[Este é o último episódio de A HORA DAS SOMBRAS.
Todos os episódiops ficarão ainda um tempo aqui no BLOG e definivamente
no Wattpad:https://www.wattpad.com/story/56742459-a-hora-das-sombras ]


A SEGUIR

OS DADOS DA MALDIÇÃO




Você não deve fazer acordos com o Mal, porque ele uma hora cobra a conta...
E você não deve brincar com o Mal, quando ele pode sair para fora do jogo ...
... E vir brincar com você!


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