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EPISÓDIO 13
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Enquanto você acompanhava o drama e a morte de
Mauboro, Ugui e Liana precisam deixar a proteção do seu esconderijo e
enfrentar a batalha brutal das ruas... É assim que vão reencontrar o bando do qual o garoto foi chefe , e Naique, que tomou. E lembre-se: "Chefe deposto tinha de morrer.
Era a lei da sobrevivência do bando."
EPISÓDIO 13
Úgui
passara o último dia sentindo tonturas fortes e vomitando. Mas, começava a
reagir. Seu organismo estava acostumado àquele tipo de briga. Já o de Liana,
não tinha as mesmas defesas.
-
Aquele mar é envenenado, Liana. Tudo que é porcaria pára lá. Eu devia ter
segurado você na hora, mas nem pensei. E
eu fui chefe de bando. Eu não podia ter deixado você entrar na água.
Liana
não parecia escutá-lo. Os olhos cerrados, tremendo incessantemente, a garota
estava queimando de febre. Não aceitava comer nem beber nada.
E
Úgui percebeu que pouco a pouco a estava perdendo. Os lábios dela já estavam
rachados e pálidos. E logo ela cessou de reagir às tentativas dele de animá-la,
e mesmo de se mover.
-
Se fosse que nem antigamente... meu chefe me contou como era... Tinha lugares
que tratavam de pessoas doentes. Eles curavam tudo, era só chegar lá e pedir
ajuda. Você ia ficar boa no ato!
Úgui
cobriu Liana com um resto de cobertor. Desde que ela ficara doente, mal saía do
seu lado. Dormia pouco, sempre despertando, quando ela gemia. Mas, agora,
precisava deixá-la por instantes e subir ao terraço do shopping.
De
lá, girou os olhos em volta, uma paisagem que misturava o cinzento dos céus com
a lama descorada e seca que recobria as ruínas do que fora um belo cenário
urbano, décadas atrás. “Se ainda fosse como antigamente”, pensou... “num desses
prédios, ia ter quem salvasse a Liana...” Sabia que não poderia mais esperar
para fazer alguma coisa.
-
Vou dar um jeito nisso, Liana! -
prometeu a si mesmo, voltando apressado para o abrigo onde deixara a garota.
[13... continua]
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Subitamente,
lágrimas começaram a rolar pelo seu rosto. O que estava fazendo, afinal? O que
esperava encontrar lá fora?... E nem por isso interrompeu a tarefa.
-
Eu... não sei se isso vai dar certo, Liana. Não sei... o que vai acontecer. Só
que a gente não pode só ficar aqui, parado, esperando você morrer... né?
Já
anoitecera. Úgui desceu pelas ladeiras até a praça onde, antigamente, ficava
uma estação do metrô. Era o território do seu antigo bando. A estação já fora o
esconderijo deles, mas havia desabado, muito tempo atrás. Se o pegassem, ele
sabia o que ia acontecer... Náique iria fazer questão de tortura-lo
pessoalmente, até a morte. Mas, era também a área que conhecia melhor. Talvez,
pudesse passar por eles despercebido.
-
Tem uns adultos que vivem escondidos, dentro dos prédios. Vivem no escuro, à
noite. Só saem para catar comida. Meu chefe me contava histórias sobre eles.
Alguém lá ainda deve se lembrar de como se trata de gente doente. Está ouvindo,
Liana? Você vai ficar boa!
Quando
os meninos ficavam doentes, no bando, pouco havia o que se fazer. Ou se curavam
sozinhos, ou morriam. Mas sempre tinha quem cuidasse deles, dando água, amassando comida para que eles a
engolissem, mantendo-os cobertos à noite. Só que Úgui adivinhava que isso não
seria suficiente para Liana, e que a garota não conseguiria se curar sozinha.
-
Você não nasceu nas ruas, Liana. É por isso... – murmurou ao ouvido dela. –
Mas, eu vou dar um jeito. Eu já fui chefe de bando. Você vai ficar boa!
Chegaram
à praça, onde ficava a antiga estação. E subitamente os instintos de Úgui
dispararam. Ele desatou a padiola das costas e ocultou-a num recuo protegido.
Agachou-se junto à garota, acariciou seu rosto e cochichou:
- Não vá gemer
agora, tá bem?
Então
ergueu-se, os músculos rígidos, o olhar varando a escuridão. Deixando Liana, o
punhal desceu por dentro da manga da camiseta e foi parar quase como se
recebesse uma ordem e a obedecesse, na mão do garoto. Era um punhal pequeno,
mas Úgui sabia como usá-lo.
Havia
uma tensão qualquer a sua volta.
Úgui
preparou-se para a luta antes mesmo de vê-los.
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Adivinhou
que estavam arrastando-se no chão, posicionando-se para cercá-los. Fora assim
que os treinara.
-
Por que não acendem logo suas tochas, idiotas? – gritou. – Estou sozinho!
A
provocação fora calculada. Pelo menos veria quantos eram e se Náique estava no
comando do grupo. Agora, ia precisar negociar. Raciocinar, raciocinar... sua
vida e a vida de Liana dependiam disso. Se pelo menos prometessem cuidar
dela... “Comigo, eles fazem o que quiserem”, disse a si mesmo. Mas, sabia muito
bem o medo que sentia. Sabia o que poderiam fazer, se virasse um brinquedo do
bando... No entanto, a mentira o fez se sentir bem, como quando era chefe do
bando. Sentiu-se grande. Como se fosse mesmo forte o bastante para defender
Liana.
As
tochas se acenderam quase ao mesmo tempo. Úgui não se surpreendeu ao reconhecer
os rostos. Eram os garotos maiores do seu antigo bando. Justamente os que
primeiro se passaram para o lado de Náique. Entretanto, estranhou não ver seu
sucessor à frente deles. Náique não costumava ficar atrás e mandar os outros se
exporem ao primeiro ataque. E percebeu também que não avançavam ao mesmo tempo,
fechando o círculo nele. Estavam meio desarrumados...como se não houvesse um
guia para dar o comando...
-
Quero falar com Náique! Não façam nada sem me deixar antes falar com Náique, ou
vão se arrepender.
-
Náique está morto – disse uma garota.
Ugui
teve um choque.
-
Um bicho blindado! – continuou ela. – A metralhadora. Cortou ele em dois.
Estavam em cima de um grupo de garotos menores. Náique pulou na frente para
tirá-los de lá. Acertaram ele. Todos eles.
-
Náique era... valente mesmo – murmurou Úgui, abaixando a cabeça. - E sempre
protegia os meninos menores. – Por instantes, lhe veio à cabeça a imagem do
pequeno menino que fora Náique, agarrado nele, lhe perguntando coisas. Talvez,
se não o tivesse desapontado... – Acho que ele nasceu para ser chefe de bando!
-
A gente está sem chefe agora! – disse um garoto com feridas na testa e um braço
envolvido numa atadura suja de sangue. - Foi ruim aquela noite. Muitos guias
morreram também. Outros, o bicho blindado engoliu. E toda a noite eles voltam e
caem em cima da gente. Parece que sempre sabem onde a gente se esconde.
-
Então... Vocês precisam mudar de território. Pode ter acontecido de os tiras
terem seguido vocês, sem aparecer, até mapear todos os esconderijos. E agora,
sabem onde pegar vocês.
- Você era um bom chefe, Úgui! – falou uma das
garotas maiores. - Era... quase tão bom quanto o Náique. Quer ser nosso chefe
de novo?
Todos
aqueles rostos, esperando uma resposta. E mais tochas foram se acendendo. O bando
inteiro estava ali, pedindo que ele aceitasse.
-
Vocês ficaram doidos? – berrou Úgui. – Não podem sair todos juntos assim. Ainda
mais com os tiras caçando direto vocês...!
-
A gente tá passando muita fome, Úgui!
Um
assovio agudo veio do alto de um monturo. “Pelo menos, não esqueceram de
colocar vigias”, pensou Úgui, aliviado. Já avistava a claridade dos faróis dos
bichos blindados, chegando. Na padiola, Liana soltou um fraco gemido. Úgui
sabia que a garota dependia inteiramente dele para sobreviver. Tinha de
escolher. E sem tempo nem para hesitar.
-
Escutem! Não posso mais tomar conta de vocês. Não sei mais... ser chefe de
bando. Náique estava certo. Eu não sirvo
mais pra isso. Mas, tem um jeito... Olhem, essa ladeira. Nunca o bando passou
para o outro lado. Mas, lá não é território de outro bando. De ninguém. Podem
ir sem medo. Subam a ladeira toda, depois peguem o desvio para a direita e,
quando a descida fizer uma curva grande,
vão encontrar a lateral de um prédio enorme. É a garagem... onde ficavam
os carros... quando... faz tempo, não importa. Minha entrada secreta é por lá.
Podem procurar que vão acabar achando. Tem muita coisa dentro do prédio., E
latas com água no terraço. Vocês vão encontrar. Espalhem os menores lá dentro,
para procurarem. Eles sempre encontram tudo. Podem ficar lá dentro o tempo que
quiserem. Ninguém vai encontrar vocês ali.
-
Mas, a gente queria que você viesse conosco, Úgui.
-
Não... não posso. Vocês vão ficar bem. Tem um outro bando que aparece por fora,
no outro lado, que dá para um espaço mais largo... Não sabem como entrar, mas,
se vocês quiserem, podem negociar com eles. Podem entrar para o bando deles.
Agora, corram. Os menores na frente, protegidos. Como a gente treinou. Rápido,
corram! Corram!
O
primeiro blindado apontou no alto de um monturo de lixo. O bando apagou suas
tochas e correu ladeira acima. Os vigias deixaram seus postos e foram atrás do
bando. Era uma subida íngreme demais, esburacada demais. Os blindados não
conseguiriam segui-los, mesmo que os vissem escapando.
Úgui
correu até a padiola, embrulhou Liana nas cobertas e ergueu-a nos braços. A
garota estava tão leve que Úgui sentiu o estômago contrair-se de medo. Mas, ela
ainda estava viva. Seus dedos, muito levemente, conseguiram pressionar o braço
de Úgui, como se ela, em seu delírio, soubesse que ele estava cuidando dela.
Úgui
avançou até a praça, esperando a aproximação do blindado. Quando os holofotes
caíram sobre ele, o garoto pensou em Náique., ainda pequeno, lhe perguntando para
onde iam, quando os blindados os engoliam. Talvez, Náique estivesse assistindo
aquela cena. Como se fosse um filme. Talvez.
-
Só mais um pouco, Liana! – murmurou o garoto. Eu prometo que você vai ficar
boa.
Os
megafones do blindado soltaram a cantoria, junto com as sirenes paralisadoras.
Os tiras cantavam ferozmente:
-
Somos mais que piratas! Muito mais que caubóis! Somos a Grande Dupla!
[Episódio 14... dia 7 de março]
[No Próximo Episódio...]
O veículo blindado dançou no terreno, derrapando, quando Bazu deu uma arrancada
mais brusca, tentando escapar da vala no meio da descida do morro de lixo.
Frenético, da torre, Zuca gritava para o companheiro:
- Eles estão escapando! Mais depressa, Bazu! Os desgraçadinhos estão escapando!
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