EPISÓDIO 4
Não se brinca com o MAL quando ele pode
saltar fora do jogo e vir brincar com você!
Nani acordou crente que aquele seria o SEU dia.
Afinal, era seu aniversário.
13 anos.
Com o Fator Gogoia pairando no ar.
... E mais todos os paparicos que esperava receber do pai e da
mãe.
... E o ciumeco que contava causar em
seu irmão mais novo, o Zé, auto-intitulado Monstro, inconformado por ter
de aturar Nani na posição de dono da festa.
...E tudo o mais que todo mundo espera do seu aniversário. Pacote
completo!
Só que não foi nada disso que aconteceu.
Ainda mais que o Mal nessa história - DIÁBOLO ! - está prestes a saltar do jogo... e vir jogar com Nani. AIIII! E bem neste episódio!
Definitivamente, aquele seria o dia mais esquisito que Nani já havia vivido.
A pergunta é se vai viver mesmo até o final do dia...?
DIÁBOLO
“Desde o tempo em que os magos surgiram no mundo, um dos
segredos mais bem guardados daquilo que se costuma chamar de ‘Ocultismo’ é a existência de uma
entidade que é puro Mal, pura ânsia por dominar e corromper mentes e espíritos
humanos, e os destinos daqueles a quem possui, bem como ter agentes seus a
atuar no plano físico.
Muitas histórias se contam e já se contaram sobre essa
entidade. Mais do que uma criatura, ele/ela já surgiu diversas vezes no caminho
dos seres humanos como uma potência devastadora. Tantas foram as suas
manifestações que raros são os que desvendam que se trata sempre do mesmo
inimigo.
A referência mais antiga que se tem dele remete à
Antiguidade, ainda antes do nascimento da História, nos mitos da Suméria, na
Idade do Bronze, mais de 5 mil anos atrás. Desde aquela época, um de seus nomes
mais citados, transmitidos aos servos, cujo espírito capturou, e durante
cerimônias de sacrifício humano, em altares construídos de ossos de inocentes
imolados, foi e tem sido com constância... DIÁBOLO.
Seus signos favoritos são aqueles ligados à Incerteza, ao
Acaso, à Fortuidade. Como se trata de uma entidade corruptora e viciada, se
conta que é uma de suas compulsões armar esquemas enigmáticos nos quais enreda
mortais, forçando-os a disputar jogos de vida e morte. Quem perde, se torna seu
servo, ou então um prisioneiro de um submundo de escuridão, dor e eliminação de
consciência, onde vagará para sempre, reduzido a uma não-existência. Seu rastro
na História, embora sempre dissimulado, está impregnado de maldições
ancestrais, eventos repletos de estranheza e vilanias.
Diábolo não tem forma material própria. Mas, segundo a
tradição, escolhe o pior ser, numa comunidade, infiltra-se nele e, através
dessa sua criatura, satisfaz sua sanha perversa. Age sempre antes que se
apercebam da sua intervenção, ou que, aqueles que o pressentem, consigam convencer-se
inteiramente, ou aos demais, que estão sob a trama que ele elabora, de que ali
está Diábolo, que ele existe e está agindo sublinarmente a cada episódio em
curso.
Pouca esperança há para aqueles sobre os quais baixa sua
sombra. Uma vez entre os inocentes, fica à espreita, o tempo todo, ampliando
cada vez mais seu predomínio. Tudo o que se pode fazer é torcer para que a
Providência os proteja, se apiede deles e os salve. Muito embora, isso jamais
tenha ocorrido!
Um aviso... Há um antiquíssimo ditado que aconselha: ‘ Não se brinca
com o MAL quando ele pode saltar fora do jogo e vir brincar com você!’. Seria sensato dar atenção a essas palavras.
Boa Morte... Ou melhor, Boa Sorte!”
RECAPITULANDO
A
imagem da tela do laptop estremeceu, as letras se dissolveram, Azazel Fisto, o
jabuti virtual de estimação do pai de Nani retomou seu
arrasta-pra-cá/arrasta-pra-lá e, como se nada tivesse acontecido, ignorou o
garoto e sua aflição.
- Peraí!
Peraí! – disse Nani, sem ligar para o fato de estar falando para si mesmo. –
Deixa ver se entendi. Acordo, no dia do meu aniversário. Sei que é feriado
porque... me disseram que seria. Meu pai, ou minha mãe, nem lembro mais quem
foi. Só que a minha família está desaparecida. A não ser meu irmão, mas esse não
conta. Se nunca foi muito meu parente, nem parte da espécie humana, pelo que
estou informado, muito menos agora! Na Além da Imaginação, só acontece
doideira, e no final os Lucios desaparecem. O Azazel Fisto também endoidou (e
não estou totalmente convencido de que não é ele o possuído por aqui! O culpado de tudo...!), o laptop do meu
pai sabe de coisas que não deveria saber, porque foi o Lúcio Filho que me
contou e era segredo, pelo que ele me disse. Tem umas ideias malucas pipocando
na minha cabeça (como desconfiar do Azazel Fisto, e até inventar uma história
para ele). E para fechar a bagunça, tem estes dados... – disse, puxando os dados de bronze do bolso -... que não
deviam estar no meu bolso, mas estão ...
e é claro que eu vou jogar os três na primeira lixeira que encontrar... mas não
aqui dentro da minha casa... E o que mais? O que está faltando? Quem?...
Foi
então que se lembrou de um detalhe... Que não era detalhe coisa nenhuma., Que
era toda a suadeira de quando fora dormir, na noite anterior. De tanta
ansiedade, de tanto nervoso e pressa e medo juntos. De sonhos confusos,
tumultuados, onde ela aparecia, cada momento de um jeito diferente, como se
fossem vários personagens da mesma atriz. Uma atriz de olhos de pérolas negras.
Olhos oblíquos. Olhos de arrasar.
E ele, sonhando, se debatia, e acordava
por instantes, tomado da vontade de chegar logo o momento, e ao mesmo tempo apavorado,
querendo que não chegasse nunca...
...
Porque, acima de tudo, havia o Fator
Gogoia.
A Linda.
A
Poderosa Gogoia.
A Indecifrável
Gogoia.
Em quem
ele pensava tanto... tanto...
E que
sabia disso.
Sabia
mesmo. Como sabia!
E que
mandara para ele uma mensagem via ifone prometendo que, na comemoração de
aniversário dele, ia lhe dar um beijaço!
(Seu
primeiro beijo e ainda por cima um beijaço...Então, como seria?)...
Isso, ele querendo ou não. Que estivesse
preparado.
E ele
estava.
DARK GOGÓIA
Gogóia,
quase Gótica!
Nani a encontrou numa situação muito estranha.
Gogóia
sempre se apresentava estilosa, mas nunca como hoje. Ainda mais ali, no terraço
do prédio, tudo armado como se fosse um templo, e ela era a habitante, a dona,
a maioral do pedaço.
Nani
não entendera muito bem como chegara até ali. No apartamento, instantes atrás,
ainda se refazendo da liçãozinha que Azazel Fisto, o jabuti, lhe dera, sobre Diábolo, de repente escutou um zumbido e
algo em seu bolso vibrou ... O grito que Nani deu seria capaz de transformar Azazel
Fisto em velocista.
Mas, o
garotão ainda tinha miolos o bastante para raciocinar que, bem mais fácil do
que sua bermuda ter ficado mal-assombrada,
era que o seu ifone estivesse chamando.
E
era... Havia uma mensagem na tela: “A Sacerdotisa está no alto acima do mais
alto...”
E o
número do chamador, esse, ele sabia de cor. Era de Gogóia.
De
todas as garotas que ele conhecia, Gogóia era a recordista em tirar seu sono.
Como pensava nela. E nos sonhos... como sonhava
com ela.
Matar a
charada fora fácil. O “alto acima do mais
alto” era o play onde, quando era
criança, ia brincar, no terraço do prédio. Acima do andar mais alto do prédio. Fora
lá que conhecera um dia uma menina, que morava num outro bloco do edifício, e
que apareceu ali, com seus olhos que mais pareciam o canto das sereias da
Mitologia, e os cabelos encaracolados super esvoaçantes, dizendo:
- Vim
brincar com vocês!
Gogóia
não pedia licença. E se convidava na maior.
Sempre
fora uma figura, mas, naquele dia... Estava D++++!
Seus
cabelos estavam bem curtos – um corte que ela estava estreando ali, naquela
cena, que era toda dela (e ele, nem figurante; somente plateia) –, espetados
para o alto, como se fossem cobrinhas ouriçadas. Ou como se tivesse acabado de
tomar um choque elétrico (e bota voltagem nisso!). Vestia um colante,
absolutamente colado, preto. A
maquiagem também era toda dark:
sombra e lábios pretos. Esmalte preto nas unhas que pareceram a Nani bem mais
compridas do que quando cruzara com a garota, no dia anterior.
...“Quando
essa doideira ainda não tinha começado a acontecer...”, lamentou.
Estava
sentada numa banqueta – devia ser isso – coberta por um tecido brilhoso, também
negro. Que tinha sido colocada para ela sobre um tablado, igualmente pintado de
preto, no qual havia um enorme espelho, com moldura de madeira escura. Gogóia
não olhava diretamente para ele. Estava na cara que ela esperava por ele, mas
de costas, mirando no espelho. Seu corpo estava meio torcido, meio de serpente
enroscada numa árvore, faktando, é claro, a árvore, o que deixava a torção mais
no ar, mais estranha. E assim que a
imagem dele apareceu no espelho, ela disse, numa voz mais do que arrepiante ...
-
Preparado para escutar sua sentença, Inferior?
- Como
é que é? Gogóia! – exclamou Nani, tentando aproximar-se e olhar Gogoia de
frente. – Eu sou o quê? Ei! Meu aniversário é hoje! Isso não lembra nada a
você, não? Era tudo papo, era?
-
Silêncio, Inferior! – disse Gogoia, com voz estridente. Nani paralisou-se. – E não ouse tentar olhar nos meus olhos, ou
será reduzido a pó!
- Tá bem, tá bem! Mas...
- Sou a Sacerdotisa de Diábolo –
interrompeu Gogoia. – Em nome do meu mestre, transmito a você o que foi
decidido sobre seu destino. Escute com atenção. A cada cem anos, meu Mestre, para divertir-se,
escolhe um ser inferior para o desafio. Você terá de jogar o Jogo de Diábolo. Foi
escolhido por se declarar o maior Mestre dos Jogos. Agora, vai ter de enfrentar
feras que você jamais seria capaz de imaginar que existam!
- Eu...? Mas era só... de
brincadeira, sabe? Não queria zoar com ninguém, não, não! Falei por falar, ora!
- Cale-se! – bradou. – Não há mestre a não ser o Mestre. Aprender
isso será o castigo por sua vaidade. Se perder, irá reunir-se a seus pais, e juntos
atravessarão a fronteira da dimensão das trevas. Nunca mais nenhum de vocês
será visto neste plano. Se vencer, tudo voltará ao que era.
- Tudo? Meu aniversário? O
presente que você prometeu me dar...?
- Tudo! Mas, previno você de que,
em todos os seus incontáveis milênios de existência, meu Mestre nunca perdeu uma
disputa. Você não tem escolha. É tudo ou ... o mais absoluto nada!
- Deixa disso ...! – arriscou Nani. – Vocês
todos ficaram doidos de repente? Escuta só...
- Escute você, Inferior! – ameaçou
a sacerdotisa, erguendo-se, sempre de costas, da banqueta, e sempre mantendo a
torção desconcertante do corpo. – Você tocou os Dados da Maldição. Ao fazer
isso, aceitou o desafio!
- Eu?
- O Jogo será jogado. Precisa
encontrar o Mestre, antes que ele aniquile você. É esse o desafio. Está
transmitida a mensagem!
Nani nem teve tempo de pedir um
beijinho de consolação – já que não ia receber a versão completa. Não teve
tempo para nada, na verdade. Quase imediatamente a seguir das palavras da
Sacerdotisa, uma série de pequenas explosões começou a ocorrer no terraço, uma
fumaça roxa raiada de verde jorrou de debaixo do tablado, cobrindo tudo em
volta. Nani não enxergava mais nada, mas alguma coisa o agarrou e ele começou a
se debater.
- Me larga! Me larga! – gritava o
garoto.
No entanto, o agarrão era bem mais forte do
que ele. Logo, não conseguia mais se mexer, estava exausto de tanto lutar, e
ainda levou uma bruta sacudidela, quando escutou uma voz fanhosa, desagradável,
que ele reconheceu de imediato, berrar nos seus ouvidos:
- Peste de garoto! O que você
andou aprontando por aqui! Que fumaça é essa? Responde logo”! Responde!
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