quarta-feira, 6 de abril de 2016

De Júlio Verne
a
Interestelar

A Ciência faz Histórias





               
                No  meu livro de terror + humor + aventura, “Memórias mal-assombradas de um fantasma canhoto”, um garotão maneiro, o Anjão, tem ideias muito instigantes sobre o que são fantasmas. Numa cena, ele diz: “... E se o que a gente chama de fantasma forem habitantes de um outro universo que às vezes se mistura com o nosso? Os cientistas chamam isso de interação... Pode acontecer. Só que a matéria e a energia de um universo paralelo são diferentes das do nosso. Daí, os habitantes desse universo parecem... outra coisa.”




                Tudo isso é parte de uma armadilha que ele e a turma dele, “Os Achudos”, estão aprontando pra cima do fantasmão que assombra essa história.
                Bem, claro que o Anjão é um nerd tipo vidrado em ciência.
                Mas, meu caso aqui é dizer que a Literatura – de aventura, mistério, suspense – precisa atualizar seus temas. E uma dessas fontes são as mais recentes descobertas e especulações das diversas ciências, da tecnologia, que anunciam um universo magnificamente interessante, que se tornará acessível para todo mundo, nos próximos anos.
                Que serão o Universo no qual essa garotada de hoje fará sua vida.
                Que seria um barato começar a imaginá-lo, como escritores como Júlio Verne, lá no século XIX, alimentou a imaginação de muitos leitores seus, que se tornariam cientistas...







                Vou contar uma história curiosa...
Em Viagem à lua (1865), um projétil lançado da Terra deveria descer na Lua, numa cratera chamada Mar da Tranquilidade. Isso não aconteceu, no livro de Verne, para frustração de muitos leitores, que sonhavam com a conquista do nosso satélite natural, mesmo que fosse na ficção. No entanto, muitos desses leitores se tornaram cientistas e inventores. E todos os cientistas e inventores do século XX, todos os que mantiveram o sonho de chegar à Lua, foram necessariamente leitores de Júlio Verne, que os contaminou com o micróbio da ciência e, especificamente, das viagens espaciais.
Daí, em 20 de julho de 1969, quando a Apollo 11 alunisou (desceu na Lua), pousou... no Mar da Tranquilidade. Porque Verne adivinhou que isso iria acontecer? Não creio... Mas creio que aqueles cientistas-leitores de Verne, desde quando resolveram dedicar sua vida à ciência, à astronomia e à engenharia especial, somente tinham um lugar, em suas mentes, onde o “pequeno passo de um homem, mas um passo gigantesco para a Humanidade” deveria ser dado: no Mar da Tranquilidade. Verne e Viagem à Lua  foi a inspiração de muitas dessas pessoas que idealizaram e realizaram o Projeto Apollo.
Em suas “Viagens Maravilhosas”, a série de aventuras que escreveu, Júlio Verne botou em cena diversos ramos da ciência. O mais evidente foi em “20 Mil Léguas Submarinas” (1870), com o prodígio do submarino Nautilus e do seu gênio, o capitão Nemo. E não podemos esquecer que outro dos personagens principais, o Professor Aronnax, é um grande naturalista, especializado em vida marinha – todo um mundo desconhecido ainda da grande maioria das pessoas na época.
Também em Volta ao mundo em 80 dias (1872), entrou um tanto de invenção, de atualização, sem os quais a trama seria impossível. Phileas Fogg propôs a aposta ciente de que novidades nos diversos meios e vias de transporte, que pretendia utilizar, tornariam possível dar a volta ao mundo naquele prazo que os outros achavam impossível.

Verne assim colocou a ciência dentro da história. As novidades. A imaginação de um mundo diferente, desafiante totalmente renovado, no século seguinte. Era um homem que acreditava no futuro. E que enxergava como esse futuro idealizado atraía o interesse dos leitores. Sua Viagens Maravilhosas foram um espetacular sucesso. E seus livros são lidos até hoje com prazer.








Bem, mas se Verne usava  como fantasia  a viagem do homem à Lua, ou seja, uma aventura restrita ainda ao nosso micro-sistema orbital (Terra-Lua), Arthur Clarke, em 1968, um ano antes de Neil Amstrong pisar o solo lunar, lançava um livro que iria fazer borbulhares todas as mentes daquele tempo quando ainda não eram chamados de nerds. Foi 2001, uma odisseia no espaço[1].  Na trama, uma missão espacial vai da Terra a Júpiter desvendar um mistério que tem a ver com uma civilização antiga, de nossa galáxia, e que criou uma maneira de fazer contato conosco, quando atingíssemos um certo nível de desenvolvimento científico e tecnológico. Enfatizo: se a ação, agora, já não é mais restrita à nossa vizinhança orbital mais próxima, ainda não deixa o Sistema Solar.
Dando outro grande salto, temos o recente Interestelar (2014). Novamente, uma missão especial, que sai em busca de um planeta alternativo para a espécie humana – já que a Terra se tornara inabitável (irrespirável)... E que acaba defrontando-se com as singularidades de um buraco negro,  com o labirinto em que as leis da relatividade transformam o espaço-tempo, o antes e o depois, o passado e o futuro.



Quem lê um texto farejando as intenções do autor – instinto detivesco ! – já deve ter percebido aonde quero chegar. O “universo” está se expandindo (não somente no cosmos, de fato) na ficção, nas demandas e exigências de nossa imaginação. Há cento e sessenta e poucos anos, juntávamos um bando de cientistas, que construíam um gigantesco super canhão (foi assim em “Viagem à Lua”), que disparava um projétil para alcançar a Lua. Hoje, nos envolvemos nas intimidades das forças fundamentais que criaram e sustentam este e outros universos – já que não mais se pensa em um único Universo, mas em múltiplos universos, no MULTIVERSO, segundo concepção corrente.  
Ou por outra... quando eu tinha 11 anos, meio século atrás, no colégio religioso onde estudei, se não era declaradamente pecado, era quase,  perguntar-se se haveria outros planetas, além do Sistema Solar. Em 1989, o Telescópio Hubble foi posto no espaço, um ano depois começou a nos enviar fotografias, e hoje sabemos que existem (porque já os “enxergamos”) pelo menos outros dez mil planetas, além das bordas do Sistema Solar, o que sugere fortemente que existam incontáveis planetas, galáxia afora, e sabe-se lá quantos e o que mais, nesse universo de bilhões de galáxias.




Novamente: o universo está ficando maior. A imaginação de nossos leitores – o que eles prenunciam do futuro próximo -  está com novas demandas, novas exigências. A ciência, as descobertas, as especulações científicas, sempre foram fonte, tema, ambientação para grandes aventuras, para livros e autores muito populares. Não estaria em tempo de os autores brasileiros entenderem um pouco mais de ciência? lerem um pouco mais sobre as descobertas científicas que estão se acumulando? Suprirem-se de informação e superarem esse atraso, em relação ao que o mundo lá fora lê, sonha, conversa...?



Uma dica... Um joguinho de computador super popular entre a garotada: Minecraft. Tem até romances-aventuras passados no universo Minecraft, e que são avidamente lidos por essa garotada que a gente cisma que não lê. Podem não ler o que alguns de nós acham que eles deveriam ler, embora eles não achem. Mas lêem essas histórias... E tem mais. O jogo é uma divertida exploração das concepções de universos paralelos, própria dos nerds e dos cientistas mais ousados. Entra-se por um buraco, uma fenda, e se sai num novo cenário, numa nova “textura”... num outro universo. E o garoto e a garota estão lá, se habituando a essa maneira nova de entender dimensões, tempo e espaço... que bem podem ser aquela à qual estarão vivenciando no cotidiano do seu mundo, daqui a alguns anos... (enquanto alguns dos “velhos”  de hoje vão insistir em temáticas locais, analógicas, ditas edificantes e/ou cívicas...).
Um passeio por capas de revistas já é o bastante para “suspeitarmos” quantos novos temas se abrem para a imaginação e quantas e quantas histórias há para serem escritas. E não somente pensando em Física, Astronomia...







O passado tem encantado tanto quanto a imaginação futurista, e desde Indiana Jones que a Arqueologia está na moda e nas fantasias desse pessoal que queremos como nossos leitores. Tudo a ver!



ARQUEOLOGIA E AVENTURA

Mistérios do passado
dando encrenca para uma garotada 
aqui e agora! 
   





A Engenharia Genética tem proposto soluções para o tratamento de doenças que já aterrorizaram tanto as pessoas, que sequer seu nome era pronunciado dentro de caso – o câncer, por exemplo... que hoje, muitos casos, é tratável e curável[2]. Não há mais sentido em se apavorar com o câncer, o diagnóstico de câncer não é mais uma sentença de morte, e esse é um mundo diferente do que há duas ou três décadas atrás.  
E olha que nem vou falar de informática, inteligência artificial, robótica... [3]





E das cavernas e subcavernas da Internet... e de outras nets ocultas... 
E sabe-se lá mais o que poderíamos escavar, inventar, xeretar...
Nesse novo cosmos, há tantos dilemas, tantos conflitos (a velha, permanente, universal Natureza Humana) a explorar, testando o que muda, o que não muda quando pomos nossos personagens indo até onde nenhum homem nem mulher jamais esteve. 
Em suma, vamos atualizar as histórias que escrevemos? Vamos ler mais sobre ciência, sobre as descobertas que acontecem num ritmo e num volume doidos? Vamos estimular que mais e mais leitores nossos se apaixonem por esses temas?  Que chamar alguém de futurista seja tão legal quanto chamá-lo de irado? Vamos corresponder à paixão e ao pioneirismo, a coragem para ser pousado, arrebitado e diferente, dos nerds?  ... E ao que mais atrai os leitores que tanto desejamos agradar?[4]

Montes deles, de preferência!

Vida Longa e Prosperidade para todos!
Que a Força esteja com vocês!
Nerds... Tamo’Junto! (Eu  nerds)
e=mc2 até segunda ordem!

               




[1] Estou pulando um bocado de gente, como H.G. Wells, com A guerra dos mundos, de 1868, mas minha intenção não é escrever sobre ficção científica, por isso, esta simplificação serve bem ao tema... Creio que a maioria das pessoas não leu 2001, uma odisseia no espaço, o que é uma pena, e conhece a história (com modificações em relação ao original) apresentada na antológica versão cinematográfica, do mesmo ano, dirigida por Stanley Kubrick. Por exemplo, o Planeta-destino da nave comandada pelo computador serial killer, HAL, é Saturno, no primeiro livro, e Júpiter, no filme e nos episódios seguintes (2010, o ano em que faremos contato). Vou resumir bastante a trama, aqui, mencionando somente o quen é necessário para este artigo.
[2] Não deixa de ser irônico que,  enquanto no mundo doenças como essa são alvo de pesquisas avançadíssimas, no Brasil (mas não somente aqui), doenças do século XIX, como a dengue, a zica e a febre amarela constituam o pesadelo atual de nossa população.  
[3] Ave,Isaac Asimov!
[4] Usei essa palavra por pura provocação porque tem muito chato que diz que não devemos procurar agradar nossos leitores. Eu quero sim... agradar, adular, babar, cativar, seduzir, intrigar... O que aliás é uma meta totalmente consistente com a Cultura e a Literatura Pops. Como Júlio Verne bem fazia! 


Nenhum comentário:

Postar um comentário