sexta-feira, 29 de dezembro de 2017


"E ESSE PAPO DE LITERATURA?
 - com Luiz Antonio Aguiar"


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domingo, 17 de dezembro de 2017





"E esse papo sobre Literatura?"
apresenta uma conversa sobre Machado de Assis! Tá no ar! 

MACHADEANDO #1

PS: Se você gostou dos vídeos de "E esse papo de Literatura? - com Luiz Antonio Aguiar" , inscreva-se no Canal, OK? Tô sempre lá esperando por vocês pra um papo sobre Literatura!


quarta-feira, 13 de dezembro de 2017




Meu canal já está no ar...  

" E ESSE PAPO DE LITERATURA? 
 - com Luiz Antonio Aguiar"



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truques e manhas da criação literária?



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sábado, 4 de novembro de 2017

História & Histórias





UM ROMANCE  QUE  NASCE DA MINHA PAIXÃO PELO BARROCO DO ALEIJADINHO E DE MANUEL DE ATHAYDE...

PELOS IDEAIS E SONHOS DA INCONFIDÊNCIA MINEIRA ...

PELO HEROÍSMO DE TIRADENTES...

PELA VOCAÇÃO A FAZER HISTÓRIA DAQUELA TERRA GENEROSA...

PELO COMOVENTE DELIRIO POÉTICO DOS ÁRCADES, A ENXERGAR CENÁRIOS E FIGURAS MITOLÓGICAS NOS CAMPOS E MORROS DAS GERAIS...

POR ANJOS QUE CONTAM HISTÓRIAS,  QUE AS FAZEM BROTAR EM SURRURROS DAS PEDRAS DE OURO PRETO... QUE EU AMO TAMBÉM!




  A História - do Brasil, Mundial - é uma grande fonte de Histórias. Matéria-prima da ficção. De romances, novelas e contos. Mas, para ser um bom romance histórico, na minha opinião, o livro não pode ficar preso à História. Precisa inventar. Criar peripécias, explorar mistérios, dar ritmo da aventura, compor personagens. Ou seja, de um tanto de História, como ingrediente, e outro tanto de criação (ficional), se faz um romance, novela, ou conto histórico.

          É o caso de OS ANJOS CONTAM HISTÓRIAS...

           Fato histórico: Tiradentes foi enforcado, esquartejado, e os pedaços do seu cadáver - desrespeitado, inbsultado, profanado - foram espalhados entre o Rio de Janeiro e Ouro Preto. Na cidade que foi o grande caldeirão da Revolta, a Conjura Mineira, as tropas chegaram à noite com a cabeça de Joaquim José.

          A sentença dizia que a cabeça deveria ser exposta, naquela praça (onde hoje está uma estátua gigantesca de Tiradentes). O troféu macabro seria a principal atração da festa planejada pela Coroa Portuguesa para comemorar SUA vitória e humilhar os cidadãos da cidade. Até porque permaneciam em Ouroi Preto focos rebeldes, ainda ativos apesar da repressão bárbara que a cidade soifria. Depois da festa, a cabeça ficaria ali, numa gaiola pendurada num poste, para que os amigos e a família do Herói, inclusive sua filha, assistissem sua lenta degradação.

          Mas, naquela madrugada antes da festa, a cabeça foi roubada. Mesmo com os soldados da Coroa arrombando portas de residências, prendendo suspeitos, exigindo delações, jamais foi encontrada.

     Trata-se de um mistério da Inconfidência (que ostenta outros, todos muito intrigantes). Uma ponta deixada solta na História.,..

          Matéria-prima perfeita para um romancista...!

          Daí, misturei esse mistério mais a presença do filho de Aleijadinho (Manuel Francisco), então com cerca de 15 anos, em Ouro Preto. A amiga dele - que vai se tornar sua mulher -, Joanna, filha da "Bruxa" da cidade (assim chamada porque fazia partos difíceis e conhecia chás de ervas com poderes curativos)...

           Sobre ambos, as biografias e documentos trazem menos de cinco linhas de informação. Sabemos que existiram; no mais, no meu livro, são histórias que os anjos me confidenciaram...

         E mais... a miraculosa, comovente escultura de Aleijadinho, o Barroco... As visões dos poetas arcadistas (que eram também conspiradores, Inconfidentes)... sobre um outro país (no qual sonhavam que esta terra poderia se tornar)... O heroísmo, a luta, os segredos que permanecem fechados à História...

           Tanto melhor ! Numa novela com ambientação histórica como essa, os fatos, o documental, a "verdade" não é o que move e o que anima a história. O principal é a ficcionalização. O que deve puxar o enredo é o tanto de romanceado,   a  recriação, a ficcionalização. Aqui é a Literatura da coisa que vale mais. Os recursos e técnicas e truques para (re)contar a (H)história.

          E mais essa impressão que eu tinha de que anjos revoavam sempre por Ouro Preto - cada vez que visitei a cidade para compor minha história... E que, ao bater suas asinhas, também cochichavam segredos e riam entre si... (de nossas dúvidas?)... Talvez porque para eles esses segredos e mistérios tivessem respostas..., bem debaixo dos nossos pés... naquele chão de pedras repletas, impregnadas, espiritualizadas de tanta História!

          Foi assim que nasceu OS ANJOS CONTAM HISTÓRIAS.

Prêmio Jabuti em Literatura para jovens, em 2013.

 Uma aventura histórica!




Para Comprar

https://livrariamelhoramentos.com.br/melhoramentos/os-anjos-contam-historias.html

https://livrariamelhoramentos.com.br/melhoramentos/catalogsearch/result/index/?p=2&q=Luiz+Antonio+Aguiar



sexta-feira, 29 de setembro de 2017






A Garotada do Colégio João dos Santos Areão, de Santa Rosa do Sul, com o apoio e incentivo dos professores, produziu uma festa de artes plásticas, música, dança e ointetrpretação em cima do MEMÓRIAS MAL ASSOMBRADAS DE UM FANTASMA CANHOTO. Fiquei sem palavras, jutro. Um beijão, garotada!!!

Assistam pelo link aí embaixo! BACANA DEMAIS!!!!






https://www.facebook.com/junior.bernardes.75/videos/1679305885474480/

domingo, 3 de setembro de 2017


SAIU!

A edição da Panamericana para Toda a América Latina e comunidade hispânica EUA!




Sueños en amarillo de Luiz Antônio Aguiar

Mi valoración: 5 de 5 estrellas














Luiz Antônio Aguiar, escritor brasileño y autor de Sueños en Amarillo, se declara ferviente admirador de Van Gogh y confiesa: “Cuando vi por primera vez aquella pincelada frenética, gruesa, llena de espíritu, tuve ganas de arrodillarme delante del cuadro en medio del salón del museo…”.


Al leer esta novela, que está catalogada como juvenil, pero que atrapa también a un lector mayor, sentí una enorme simpatía por Van Gogh, no específicamente por sus pinturas, sino por su persona. Durante un periodo de su vida, el pintor holandés vivió en la ciudad francesa de Arlés; allí pintó algunos de sus cuadros más famosos y también tuvieron lugar las crisis más devastadoras de su atormentada vida. La personalidad conflictiva de Van Gogh le valió la antipatía de los habitantes de la ciudad, teniendo como único amigo al cartero, llamado Joseph Roulin, quien lo acogió en su familia. Camille, uno de los hijos de Roulin, se fascina con el pintor, y con una respetuosa distancia penetra en su vida y en su obra.


Este es un relato muy emotivo contado por Camille, cuando años después de haber conocido al pintor, le escribe una carta a su hermana, quien en ese entonces era una recién nacida. Le habla de aquella época feliz de su infancia –él tenía 10 años– cuando la vida era más tranquila e inocente, y haber convivido con aquel personaje brillante, temperamental y a la vez desprotegido y débil, le mostró que la locura y la genialidad van de la mano. 



Esta es una lectura encantadora, tanto por el estilo sencillo y depurado del autor, como por la historia misma, llena de sensibilidad, de frases muy bien escritas, con descripciones hermosas de cómo era la vida en una ciudad francesa del siglo XIX, que me llevó a reconocer la obra de Van Gogh y a descubrir la de Gauguin.

Es una novela altamente recomendada, ganadora entre otras distinciones del Premio White Ravens / Biblioteca de Libros para la Juventud de Múnich en la Feria de Bolonia.



“… —El hombre es un romántico. Creó un
mundo de imágenes y piensa que vive en él.
Bien, todo pintor quiere vender sus cuadros, y
él también. Pero para Van Gogh es importante
que otros compren sus cuadros para creer
que está compartiendo sus delirios con alguien…”.



             
                           
Folheto de divulgação
Resenha Publicado no site Mais Libros:
http://maslibrosblog.blogspot.com.br/2017/08/review-suenos-en-amarillo.html

ver também neste blog mais posts sobre Sonhos em Amarelo em 






http://maslibrosblog.blogspot.com.br/2017/08/review-suenos-en-amarillo.html

quarta-feira, 2 de agosto de 2017

MACHADO de ASSIS

O BRUXO METAFÍSICO







(Lamento... mas o mini-ensaio abaixo tem uns trechos bem complicados !
Dessa vez, foi necessário; pelo menos, é curto. 
Mais indicado para Leitores-Gourmet de Machado)




Luiz Antonio Aguiar


                                                                                      




Eia! chora os dois recentes mortos, se tens lágrimas. Se só tens riso, ri-te! É a mesma coisa. O Cruzeiro, que a linda Sofia não quis fitar, como lhe pedia Rubião, está assaz alto para não discernir os risos e as lágrimas dos homens.
Quincas Borba




Por ocasião das comemorações do centenário de morte de Machado de Assis (1839-1908), certo crítico pediu publicamente que se suspendesse a tradição de se chamar Machado de Bruxo. Tentou fazer galhofa com isso. Achava tolo e já gasto o carinhoso apelido, que fora honrado até mesmo por Carlos Drummond de Andrade (no poema A um bruxo com amor). Mas, havia uma lógica nessa solicitação do referido crítico, estudioso de Machado e organizador de diversas antologias cuidadosamente compiladas de textos do Bruxo. Na visão dele, Machado é essencialmente um autor realista e sua obra tem como tônica retratos/registros históricos de momentos e processos da sociedade brasileira, naquelas décadas decisivas do século XIX e da passagem para o século XX, quando tantas mudanças ocorreram, apesar de não terem caráter de fundo, estrutural, mas institucional, quase rearranjos do poder no país.
De fato, a prática de bruxarias (ainda que literárias) não se adequa a um cronista tradicional; mesmo sendo um observador arguto, irônico, mas ainda assim um observador – um Machado-Historiador. Não é de  alquimia e de prestidigitação e/ou ilusionismo que é feita a História, pelo menos ao que conste nos veios convencionais.
A questão é se há um único Machado. Ou uma única leitura possível  do Bruxo.
Ou se, obra-prima, genial, repleta de meandros, detalhes, entrelinhas, serpentes que devoram o próprio rabo, invisibilidades, recantos, sutilezas, além de mutações permanentes e caleidoscópicas que a mantém em inesgotável reconstrução ... oferece-se generosamente à leitura, abrigando e incorporando as diferentes visões que a percorrem, tangenciam e transpassam. Acredito que, como na melhor Literatura, Machado é uma obra em que todo leitor cabe, e que cada leitor habita e transforma, relê e recria, de acordo com seu cabalismo íntimo, que se funde ao do Bruxo.



Há muitos machados. Quantos, não saberia dizer, até porque suspeito que sempre andem surgindo mais e mais. E nenhum deles é “O” Machado, o supremo, nem muito menos o único.  
Há algum tempo me dei conta de que o Machado que prefiro é aquele que opera uma metafísica irrequieta, perturbadora, que nos deixa sem resposta quanto à maioria das grandes questões cósmicas e existenciais. Que desfaz das certezas e verdades. De objetividades. De perspectivas (recortes) que pretendem ser hegemônicas. De preceitos, dogmas, pontificados. Que nos faz, não, desvendar o mistério, mas compreender sua magnitude profunda, etérea.  A fertilidade longeva de sua invulnerabilidade (Capitu traiu ou não traiu Bentinho?) . Uma leitura de Machado que talvez sugira que essa seja a postura – a não-resposta, a permanente disponibilidade de olhar, mente e coração  – que mais nos permite conviver com enigmas (e a dor) impostos pelo dia a dia.
Vejam por exemplo o embate/acasalamento (Machado fala em conúbio”, na mensagem AO LEITOR que abre Memórias Póstumas de Brás Cubas) entre a galhofa e a melancolia. Sua origem, talvez, tenha sido uma sugestão de Cervantes[1], de quem Machado era devoto. Se a questão abre Memórias Póstumas...., está perene e latente em O alienista. Também já conheci quem lesse essa novela somente enxergando nela o humor. Meia-leitura. Leitura parca. Anêmica. Assim como D. Quixote e seu poder empático nos proporcionam vivenciar a estranha combinação de riso e tristeza, o segredo da patética tragédia de Simão Bacamarte[2], cuja integridade o faz isolar-se do convívio humano, entregar-se à solidão absoluta e à morte, pode estar no mesmo enlace que desvenda o definhamento moral de Bento Santiago e a amargura por trás das gracinhas de Brás Cubas, outro solitário, cujo legado, apesar de relatado ironicamente, é nada. Ou menos que nada, o que precede o nada: a esterilidade. Eis então a solidão, a loucura diante da inexplicabilidade dos mistérios humanos, e a impossibilidade de lidar com esse aspecto conturbado da existência sem (aprender a) combinar riso e lágrimas;[3] eis a suma,  o legado, o grande final também de Quincas Borba. Que o confronta com a  imensidão. A eternidade. Novamente.


 D. Quixote
desenhado por Gustave Doré


Maldições que pesam sobre a condição humana?
A  morte.
Machado expõe nossa mortalidade e principalmente a incapacidade de nos concebermos como habitantes (futuros, em potencial, e, no caso do autor defunto, como presentes habitantes; ou talvez inquilinos) do mundo não descoberto (de Shakespeare, em Hamlet, mas também de Brás Cubas). O protagonista desse drama (a existência humana, a Humanidade) é o verme que Hamlet evoca na sua ontologia do mundo, [4] e por meio do qual fina e sarcasticamente desacata o rei (assassino e irmão do pai de Hamlet, usurpador do trono, que herda a mãe de Hamlet em seu leito, desposa-a, depois de tê-la como cúmplice na morte do rei), propondo que um soberano poderia ser defecado por um pescador mendigo. Tudo por causa de Sua Majestade, o verme,[5] aquele que reina de fato, e não o mandrião que afanou a coroa.
 Personagem costumeiramente chamado por Machado a metaforizar a nossa inaceitável mortalidade e a transitoriedade do que chamamos vida, o verme, o cemitério, a devoração das carnes pútridas (privadas da vida sob o sol, do nome, de passado: pasto somente, no mundo abaixo das lápides) e a promiscuidade das ossadas são vicissitudes que, cândida, sonsa e risonhamente, Machado  insiste em nos esfregar na cara.

Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico com saudosa lembrança estas Memórias Póstumas.
“Dedicatória” de Memórias Póstumas de Brás Cubas.


                Esse Machado metafísico desafia as leituras rasas e de águas límpidas e tranquilas. É sempre mais fácil e mediano procurar na Literatura temas pitorescos, destaques epidérmicos (e o mulato Machado foi muito acusado de racista e de fazer uma Literatura Branca, apesar de tantos momentos que contrariam essa implicância paranóica, recalcada, como O pai contra mãeO caso da vara e uma infinidade de outros em que nos brindou com uma visão de insider, não-simplista, nem panfletária, nem simplória, de quem conhece e sofreu  na pele a discriminação racial e a crueldade contra os negros no Brasil). Machado não é óbvio, jamais, mas nele encontramos o exame ficcional de opções sexuais condenadas pela hipocrisia social (ver o conto Pílades e Orestes¸ sobre amor homossexual); ou, de toda a situação de vil e sofrido rebaixamento forçado da mulher (por que uma personagem como Capitu tem de submeter-se, calada, diante das mofinas acusações de um Bentinho, sendo ela “mais mulher do que eu era homem”? por que o dono da história tinha de ser o homem? Por ser o dono da casa? chefe da família? Será que isso nunca causou estranheza no público feminino da virada para o século XX?). Trata-se de um tema dileto do Bruxo e expresso em muitos contos, como A missa do galoUns braçosNoite de AlmiranteEterno!, e outros, compondo a vívida galeria de personagens femininos de Machado. Ele é o grande vingador das vítimas da licença patriarcal (prerrogativa exclusivamente masculina), no Brasil, para o adultério. Escreve ainda em nome dos animais, sacrificados pelo progresso (ver crônica de 16 de outubro de 1892) e pela crueza dos humanos (ver crônica de 2 de abril de 1878), e entrega o poder e a posse da história ás crianças, no âmbito familiar silenciadas pela rigidez de então, que  desconhecia o que fosse  infância.[6]

William Shakespeare


Nada-se a favor da corrente ao se cobrar uma Literatura correta no palavreado, nas formalidades sociais, nas festivas (e superficiais) alusões ao folclore, embora fluida na interioridade (para a submedíocre corrente dominante, esta é falha desculpável, quando não desejável). Só que assim o que se tenta é exconjurar não só a dissecação inclemente dos costumes e das ideias prevalentes, pela Literatura, e os rompantes mais ousados da imaginação, como sua universalidade, a busca obsessiva (de Machado, de Graciliano  - em São Bernardo, principalmente - e Guimarães Rosa – sobretudo em A terceira margem do Rio , mas também em outras obras)  por esse sentimento íntimo, de todo e qualquer tempo e lugar, essa exploração de manifestações de uma fraternidade humana, existencial e abissal, camuflada por superfícies, pulsando abaixo da pele e das aparências,  a exigir sensibilidade, inventividade e compenetração de leitura (e releituras, muitas), a proporcionar amadurecimento do gosto e do paladar de leitura literária, e mais ainda do espírito, ao parecer crescer junto com o leitor, e oferecer mais e mais ao leitor à medida que este se torne maior e maior... É mais fácil requisitar da Literatura o exótico e o evidente, o apelo populista, o proselitismo, o doutrinarismo, o sectarismo e a ostentação deste ou daquele moralismo, provincianismo, regionalismo, nativismo, nacionalismo ou civismo. E assim evadir-se, deixar de se arriscar a encarar-se a si mesmo, ou a descer à forja tectônica onde  Machado compõe seus personagens e tramas.

Edgar Allan Poe




Em contraponto, há uma comunhão de angústias e esperanças, de ilusões e desilusões, que tocam a todos nós, criaturas de olhos arregalados diante do mundo, e que nos tornam seres semelhantes, de uma mesma espécie (espiritual, existencial), mesmo aos que reduziram sua vida ao vazio de um Hades da Mitologia Grega. E talvez seja este um de nossos elos essenciais, o que compartilhamos com os demais viventes racionais-afetivos do planeta, o medo diante dessa agonia subliminar que TODOS carregamos. E, quem sabe,  a recusa de enxerga-la como  parte de nós  seja uma das correntezas mais traiçoeiras e poderosas a nos imobilizar diante das oportunidades da vida (Alas, Betinho, por que você não soube ser feliz com Caputu...?) e nos arrastar para o sumidouro. Para o poço sem fundo.
                Ou, de novo, para o Undiscovery Country. [7]
                Ei-lo, o país tenebroso. Machado nos leva a vislumbrá-lo evocando imagens que estão inculcadas, incrustradas em nós, que sabemos que, longe de serem produto de qualquer verdade ou clarividência externa, são as nossas assombrações. São fios da tessitura do nosso espírito. Inalienáveis. Inescapáveis. E, se alcançarmos a felicidade (que não é impossível, na visão de Machado e no destino que concedeu a muitos de seus personagens), será carregando essas imagens de terror em nossa busca. Se pudermos ser felizes será incorporando essa faceta ambígua de nossa felicidade. Será com ela. Somos seus hospedeiros perpétuos, numa simbiose que não se esgarça. Acontece, felizmente, que somos capazes de lidar  com isso, graças  a um dom (entre outros) que possuímos – criar/ler/recriar a dimensão humana no mundo, valendo-se da bruxaria que Machado cultuou apaixonadamente: a Literatura.
               Assim como o grande feitiço almejado pelos alquimistas era transformarem a si mesmos, recriarem-se, no trâmite de sua criação mágica, há uma leitura de Machado que abala a gente. Que pode revirar nossas concepções de Vida e de Morte. Que é bem capaz de nos impregnar. De mudar o que há de mais  sedimentado em nossa maneira de nos vermos no mundo. Ou seja, de mudar o que conhecemos por mundo. Quem aceita se expor (mesmo que literariamente) a tal perigo?
                Para mim, este é o mais grandioso Machado.
                E que cada qual invoque o seu.



MACHADEANDO



O Mínimo e o Escondido
coletânea de Crônicas de Machado
Comentadas, Anotadas, com 1001 facilitações e seduções de leitura


 Clássicos em Graphic Novels



Coleção 
DESCOBRINDO OS CLÁSSICOS
Tutoriais de Leitura
Para Iniciar Garotada nas Bruxarias Machadianas







Machado e Juca
- best seller há quase 20 anos -
Machado vira um velhinho sapeca que investiga um crime no ano em que escreveu
D. CASMURRO. Ajudando as investigações: JUCA, um espoerto garoto, sapateiro de rua!!! Mistério e AVENTURA COM SABORES MACHADIANOS. Convidados especiais: Vários personagens de Machado, além de Carolina e outras celebridades. 





A aventura de vida e glória de um antoigo dicionário contada por ele mesmo... Atração especial:? as lembranças de seu dono mais querido... Um jovem escritor Machado de quem foi o primeiro dicionário que teve na vida. Adivinhem quem era...? Perigos pelos quais só um dicionário poderia passar. Um sucesso entre a garotada desde o lançamento!

Oficinas e Palestras sobre Machado de Assis, para garotada, professores, pais e público em geral, ver CARDÁPIO em 






[1] "procurai também que, lendo a vossa história, o melancólico se mova ao riso, o risonho o acrescente ..." .
               “Prólogo” de D. Quixote, Cervantes, 1605. Volume 1, p.35. Tradução Sérgio Molina.[1]

[2] Poe e Machado questionaram a inflexibilidade do diagnóstico e a discriminação da loucura mais de um século antes de Michel Foucault, quando isso não era cogitado pela inteligência que lhes foi contemporânea. Ambos exploraram a loucura para questionar... o que se entendia  como sanidade. Ver em Poe O sistema do Dr. Tarr e do Dr. Fether, predecessor de O alienista, e em Machado, além dessa que é sua novela mais popular, a crônica de 31 de maio de 1896. 
[3] É inviável a meu ver uma leitura unidimensional  de Machado. Cada leitura tem de conter em si o germe de sua própria contestação. Ser fiel a Machado é trair Machado! Ser simultaneamente tese e antítese, sem esperanças nem pretensão de uma síntese. Nem branco, nem preto; nem claro, nem escuro; como na penumbra habitada por atormentadas e atormentadoras  assombrações de onde Rembrandt extrai  as figuras e os cenários de seus quadros. Ali pululam as respostas para os mistérios e incertezas; mas, tentarmos nos agarrar a essas respostas é como confiar no brilho de uma estrela. Quando o vemos, aqui na Terra, a estrela que o emitiu já não está, faz milênios,  naquele mesmo lugar do cosmos. O corvo-profeta de POE nos revela essa artimanha do tempo: Nunca mais! Nunca Mais! (Machado foi o primeiro tradutor desse poema para o português.)
[4] Há indícios de uma tradição medieval de pensamento herético na qual a deterioração biológica seria a entidade de gestação da vida. Ver O queijo e os vermes, de Carlo Guinsburg, Companhia das Letras, 1987.
[5] Ver entre outras as crônicas de 9 de junho de 1894 e a de 12 de dezembro de 1884, ambas ao mesmo tempo, paródias e ampliações da conhecida cena (Ato V, cena 1) de Hamlet. Nessa segunda crônica, o narrador-cronista vai ao cemitério indagar sobre um homem que ganhou momentânea celebridade, um tal Castro Malta que, preso, acusado de um assassinato, morreu na cadeia sob torturas para que confessasse o crime. O caso provocou comoção. Mas, o verme interrogado diz somente que , para o mundo abaixo das lápides, ninguém carrega nome nem sobrenome.  Importa somente a maciez da sua carne.  Mais um pouco e o verme teria repetido, como se fosse o capítulo de encerramento de Memórias Póstumas ... “O resto é silêncio” (Ato V, cena 2), derradeira fala, neste mundo, do Príncipe da Dinamarca.  

[6] Ver contos Umas férias e Conto de escola. Crianças mal são mencionadas em poucas ocasiões na Literatura do século XIX. A cultura da época pretendia conter as crianças no papel de “adulto imperfeito” (como escreveu Monteiro Lobato, machadiano de coração), uma criatura em aprendizado/domesticação, que deveria ser “visto e não ouvido”. De fato, infância não existe na sociedade do século XIX, não há mundo infantil, imaginação é igual a mentira, brincadeira é pouco mais do que perda de tempo, maldosamente tida sob a pecha de coisa de criança, coisa a ser superada na obrigatoriedade de a criança ganhar juízocrescervirar o quanto antes um adulto (completo).  

[7] Hamlet proclama que, desse país, ninguém volta. Machado talvez tenha aceitado o desafio do Príncipe Shakespeareano e nos ofereça vislumbres do Reino Absurdo, e até mesmo nos apresente um de seus súditos, retornado, Brás Cubas, para nos sugerir como é a vida por lá. Brás Cubas revoga a condenação proferida em Hamlet. Machado subverte Shakespeare.




LANÇAMENTOS / 2017













quinta-feira, 30 de março de 2017



Sobre Minha Experiência nos cursos JOVENS LEITORES e FORMAÇÃO DE LEITORES, realizados pela parceria SME-RJ-FNLIJ

(texto encomendado pela FNLIJ para livro sobre o curso)



De : Luiz Antonio Aguiar
Para: FNLIJ


1.     A experiência deste trabalho nos Cursos da FNLIJ mudou sua forma de ver a escola pública?

  :                    LAA:
Indiretamente, sim. Me deu uma visão mais clara do professor e do bibliotecário dessa escola, que luta tanto não só para se qualificar como para motivar a meninada e a garotada para a Literatura, apesar da falta de recursos e de incentivos, de contrapartidas, como aumento de remuneração, ascensão em planos de carreira etc. Muitos deles são idealistas, apaixonados pelo ofício e solidários com suas crianças e jovens, com plena consciência de que na escola está a chance de mudarem de vida.
Ao mesmo tempo, ao direcionar as aulas de Literatura para o professor, para apurar seu gosto pela Literatura, o curso mostra um bom caminho para democratizar a Literatura no país, que seria lhe dar um lugar especial dentro da escola e da educação, com autonomia em relação aos objetivos curriculares e pedagógicos, visando tão somente (e é muito!) a ampliação de horizontes existenciais e intelectuais dos leitores que puder cativar. Nesse sentido, a educação pública e a privada têm o mesmo trajeto a cumprir, as mesmas dificuldades e preconceitos a vencer, a mesma ruptura a realizar.

2.       Conte um fato marcante, específico, particular que tenha sido significativo ao ministrar estas aulas.


LAA
Foram muitos, mas em especial a avaliação que tive na minha primeira rodada de aulas. Foi muito ruim, tipo nota 7. Daí, não me conformei, consultei quem já estava rodado no curso, pedi opiniões e conselhos, repensei o que eu queria fazer, minha proposta para dar aula de Literatura, e voltei ao batente. Minhas avaliações melhoraram significativamente, deixando-me orgulhoso do trabalho que eu poderia e posso realizar. Vi então que ensinar  só existe se o outro aprende. Que ensinar é um aprendizado e que o feed-back, as avaliações e reformulações são indispensáveis nesse ofício. Foi uma lição de vida, que me deram.

3.       Esta experiência nos Cursos da FNLIJ se multiplicou em outros cursos? De que forma?

LAA
Sim. Como sou escritor e correr o país falando a diferentes plateias é parte do meu trabalho, os cursos que dei foram reproduzidos em outros lugares, sempre (aproveitando a lição recebida, mencionada acima) tentando me adaptar ao meio, ao público, buscando a interatividade, a comunicação. Continuo ministrando esses cursos, dando aula de Literatura – e aliás, hoje em dia, incorporei mais esse atributo a minha identidade; com muito orgulho, sou um professor de Literatura.



segunda-feira, 27 de março de 2017




ARQUEOLOGIAS LITERÁRIAS

Ensaio na Revista Ponto 11 - SESI SP

"O Pop do Clássico & o Clássico do Pop"






Minhas Arqueologias Literárias estão na revista Ponto 11, que acaba de sair. É da editora Sesi-SP. No artigo, está um extrato dos debates q publico aqui em meu blog e de toda a pesquisa e reflexão q venho fazendo, buscando atualizar a leitura dos clássicos e revalorizar a Literatura Pop. 


Será q a kryptonita é descendente do Calcanhar de Aquiles - do Aquiles de Homero? E o q teria a ver o Hulk com Mr. Hyde ? E Oliver Twist com Harry Potter? Pra quem gosta de ousadias e provocações para ler e pensar Literatura, tá lá!






A revista Ponto pode ser solicitada gratuitamente pelo email: divulgacao_editora@sesisenaisp.org.br.

terça-feira, 21 de março de 2017

OS DADOS DA MALDIÇÃO trailer




Aventure-se! 

[trailer]

OS DADOS DA MALDIÇÃO




Não se brinca com o MAL quando ele pode saltar fora do jogo e vir brincar com você!



O Tabuleiro está armado!
As Peças foram colocadas em suas posições!
Os Dado rolam!
O Jogo vai começar...!


É só um jogo... Ou não?



OS DADOS

                Foi no Grande Bazar de Istambul, capital da Turquia, que Lúcio, Pai, colecionador de coisas estranhas e dono da Além da Imaginação, comprou uma caixa de madeira negra com o tabuleiro e... aqueles três dados de bronze.
                Era apenas um jogo... um jogo desconhecido... Mas, ainda assim, somente um jogo...
                Ou não?
                Afinal, como um troço desses ia ser de verdade? Um jogo de tabuleiro? Que coisa mais antiga!
             Na caixa, estava gravada a mensagem: “Não se brinca com o MAL quando ele pode saltar fora do jogo e vir brincar com você!”
                Quer dizer... se ele lançasse os dados... se os fizesse rolar... ou talvez só de tocar neles...
                O Jogo iria começar!





O TABULEIRO

ALÉM DA IMAGINAÇÃO. É o nome da loja de artigos nerds do Lucio.  É lá que a turma do Nani se reúne, para trocar dicas nerds, cards nerds, exibir camisetas nerds e bater papos nerds. Enfim, é lá que as coisas estranhas... acontecem! É uma das lojas do térreo do prédio onde mora Nani. Nesse jogo, o tabuleiro é o prédio de Nani, inclusive as lojas do térreo, principalmente o que está Além da Imaginação.


AS PEÇAS
(E não pense que você é um personagem só porque é de carne e osso; neste jogo, tudo que é lançado no tabuleiro é peça, nada mais do que peça... Adivinha quem está dizendo isso!)

NANI. Ele faz 13 anos hoje, quando começa a história. Só o que podia esperar era uma festa-surpresa... dessas que nunca enganam o aniversariante... dessas que ele sabe que vai acontecer... Até porque a Gogoia, linda de derreter iceberg por telepatia, vizinha dele, no prédio, prometeu que ia ter mesmo uma surpresa... Ela deu sua Palavra de Bruxa que ia lhe tacar um beijo no meio da festa. Um beijo... daqueles! E Nani (apelido de Ernani) foi avisado... Disso e de que não devia lançar os dados, senão o jogo começava, a maldição seria acionada, e aí... aí...

LÚCIO. Mal humorado, rabugento, alquimista, nerd veterano, com histórias de viagens estranhas, ou sobre objetos estranhos. É dono da Além da Imaginação e pai do Lucio Filho. Mas, a loja não vai bem.  Tanto que o dono dela – e das demais lojas do térreo do prédio, onde ele mora e também é síndico, Seu Ricardo – está ameaçando despejar o Lúcio, se ele não concordar com um super aumento do aluguel.

LUCIO FILHO.  Filho de nerd, às vezes, nerd também é. No caso do Lúcio Filho, é assim que funciona. Ele é o maior amigo do Nani, mas um pouquinho mais velho. Foi ele na verdade quem desencavou, num armário do fundo da loja no qual não devia mexer, a caixa com o Jogo. Assim, a culpa também é dele e por isso merece o que vai acontecer.

GOGOIA. Gatíssima, inteligentíssima, toda atrevida! Com fama de bruxa, ainda por cima, para melhorar o lance todo. E o azar (ou sorte) do Nani é que o aniversário dele, que já é no dia 13 de agosto, caiu numa sexta-feira de Lua Cheia.

MONSTRO. Também conhecido como irmão caçula do Nani: 10 anos. Recusa-se a assumir seu nome de batismo (alegando que não foi ele quem o escolheu): José. Assim, vive trocando de nome. Para simplificar, Nani, quando não quer aborrecê-lo (para isso, basta chamar o menino de ), o chama pelo nome com o qual ficará conhecido nessa história: MONSTRO.

SEU RICARDO (ou Ricard-o-Ogro, segundo o Pai do Nani). Grande candidato a ser o vilão dessa história. O vilão secreto, o que age oculto nas sombras. Mas, não há provas. Irmão da mãe de Nani (que se chama MARIETA), grande inimigo do pai de Nani (FELIPE), que agora decidiu que vai mesmo concorrer a síndico do prédio, para desbancar  seu Ricardo (a quem acha, além de chato, um tirano). Mas, será mesmo que ele é quem pratica todas as maldades dessa história? Será que ele secretamente é... DIÁBOLO.



DIÁBOLO. Nenhuma informação será dada sobre ele aqui. Você que se vire. O Jogo vai começar! 

Os Dados da Maldição / EPISÓDIO 1

EPISÓDIO 1

[seriado em 6 episódios dominicais]                                             





OS DADOS DA MALDIÇÃO


Luiz Antonio Aguiar




Não se brinca com o MAL quando ele pode saltar fora do jogo e vir brincar com você!







13 de agosto, Sexta-Feira
e, para completar, Lua Cheia.
08:00 da Manhã


                 Nani acordou crente que aquele seria o SEU dia.
Afinal, era seu aniversário. 
13 anos.
Com o Fator Gogoia pairando no ar. 
... E mais todos os paparicos  que esperava receber do pai e da mãe. 
... E o ciumeco que contava causar em  seu irmão mais novo, o Zé, auto-intitulado Monstro, inconformado por ter de aturar Nani na posição de dono da festa. 
...E tudo o mais que todo mundo espera do seu aniversário. Pacote completo!
Só que não foi nada disso que aconteceu. 
Aquele seria o dia mais esquisito que Nani já havia vivido. 



Era sexta-feira.
                13 de agosto e Lua Cheia.
                Mas, não deveria ser um dia tão esquisito assim.
                Mesmo sendo um feriado meio repentino ...
... (Dani soubera do feriado pela mãe, na noite anterior, só não sabia que feriado era. E daí? Nem perguntou. Nem se lembrou de perguntar. Feriado é sempre mais do que ótimo, ponto final. Sabia somente que não teria colégio naquele dia, nem os pais iriam trabalhar, o que era legal porque estariam livres para trata-lo feito príncipe ...
... Pelo menos, foi o que ele acreditou que aconteceria.). 
Afinal, dia do aniversário da gente é para ser D++++.
Não deveria ser chamado de “esquisito”. 
Não, não deveria.
                Mesmo ele fazendo 13 anos nesse aniversário.
                Isso é o que pensava Nani, tentando entender onde tinha se metido a sua família, justamente naquela manhã, quando ele acordou e saiu do seu quarto crente que iria receber abraços, talvez um presente antes da festa e, melhor de tudo, o grunhido de ciumenta infelicidade do seu irmão caçula, mas...
                Em vez disso, encontrou tudo quieto, tudo silencioso.
                Como se não houvesse ninguém no apartamento.
                Mas, como faziam isso com ele? Abandonado no dia de seu aniversário? Será que esqueceram?
                - Não acredito! – exclamou, chateado. – Eles devem estar escondidos por aí, esperando eu sair pra pularem em cima de mim gritando “Surpresa!”.   Só pode ser!
                Deu uma geral na casa. Repetiu. Depois, busca pente fino. E nada!
                - Mas, que sujeira! – gritou.
                Seu grito ecoou sem resposta pelo apartamento.
                Não ia ter paparico. Nem café da manhã especial. Nem festa. Nem o prazer de flagrar o ressentimento do Monstro, naquele dia.
                Não ia ter nada. O dia tinha virado nada.
                Era verdade, ele que engolisse. Que se conformasse. A família havia largado dele no dia do seu aniversário. Foi-se. Sumiu desta dimensão. E lá estava Nani, ruminando sua mágoa, e sem saber para onde ir nem o que fazer.
Ele, o único habitante do apartamento vazio.
Ou, talvez, não fosse o único.



Grande Bazar, Istambul, Turquia,
 ± 25 anos antes


                O mercado de rua suk, em árabe - de Istambul é um labirinto que, segundo acreditam, cresce um pouco mais a cada noite. Somos admitidos nele por insuspeitas entradas. São portões, num fundo de rua, entre um paredão e outro, sem grande destaque no cenário urbano, e guarnecidos de grades de ferro. Nada que nos faça prever o que há ali dentro. E, quando vemos, somos envolvidos por uma cidade incrustada nas entranhas da outra cidade. Istambul é a hospedeira dessa criatura.
O difícil é saber quem comanda quem. 
Não há registros precisos de quando o Grande Bazar começou a surgir, como um agrupamento de pequenos negócios de rua. A história oficial nos fala do século XV, mas, há lendas que mencionam um mercado – que pode ter sido o Grande Bazar original – em Constantinopla, como se chamava Istambul, quando era a capital do Império Romano, no século IV.
E, antes disso, talvez... Mas, ninguém sabe. É uma memória que se perdeu.
A área central do Grande Bazar é a mais antiga. É também a mais escura, onde as vielas são mais estreitas, as lojas – tendas, stands precários – são menores e vendem as mercadorias mais bizarras.
Lucio era naquele tempo um jovem arqueólogo brasileiro, deslumbrado com tudo o que pudesse cheirar a mistério do passado. Era natural que fosse a Istambul - onde a história da civilização humana viveu momentos decisivos – para conhecer o museu arqueológico de lá, um dos mais fantásticos do mundo. Mais natural ainda que desse um pulo no Grande Bazar.
No presente,  iremos reencontrá-lo como dono da loja de games e objetos nerds – a Além da Imaginação. E será conhecido como Lúcio Sorriso. E Sorriso é o apelido debochado que os frequentadores da loja lhe deram, justamente porque se trata, nos dias de hoje, do cara mais mal-humorado que já se viu atendendo o público. Mas, não tinha essa marca azeda, naqueles anos, principalmente em sua exploração pelo Grande Bazar. Pelo contrário, estava animadíssimo por estar conhecendo aquele cenário de histórias mágicas.
 Podia-se dizer que era um cara que sempre tinha a esperança de encontrar algum tesouro oculto “nas dobras e disfarces do tempo” (a expressão é de um ensaio que ele havia escrito na universidade).
Sua transformação talvez (ele não terá o hábito de falar sobre isso) tenha a ver com algo que irá acontecer exatamente naquele dia em que atravessou o portão de entrada no Grande Bazar. Ele havia se distraído apreciando objetos pitorescos, farejando os aromas de um outro mundo – que pairam em toda a Istambul, mas é ainda mais impregnado e difícil de decifrar no Grande Bazar – e, quando viu, havia se metido na  parte mais antiga do suk. Estava diante de uma pequena tenda, onde entrou.
Nunca saberia dizer o que o tinha atraído ali. Não se tratava de uma tenda diferente; pelo contrário, tinha um jeito ordinário, miúdo, era apertada, algo imersa na penumbra, e o cheiro ali dentro o fez se lembrar dos fundilhos de alguns camelos que havia montado no Egito, semanas antes. 
Talvez, tivesse na cabeça demorar-se apenas alguns minutos. Ou segundos. De fato, na hora, não diria que fora atraído, mas que entrara ali como poderia ter entrado na tenda ao lado, ou em nenhuma. Pensar em algum tipo de atração foi algo que veio muito, muito depois.
Era uma tenda de lâmpadas de azeite. Havia as de latão, as de cobre, as de estanho, todas, mal ou bem, reproduzindo o que um turista imaginoso pensaria em comprar, como se estivesse levando uma Lâmpada de Aladim. Mas, o homem que o recebeu dentro da tenda logo desfez o encanto:
- Não há lâmpadas encantadas aqui – disse o sujeito sorrindo, em inglês.
Túnica branca, calças verdes, muito largas e ambas de uma seda amassada, típica da região. Calçava sandálias de couro cru. Tinha mais de sessenta anos, mas Lúcio não foi capaz de lhe precisar a idade. Pele bastante clara, olhos entre verdes e cor de tijolo, cabelos grisalhos, presos no alto da cabeça num coque, barba e bigodes compridos. O que imediatamente chamou a atenção de Lúcio foram as tatuagens que ele tinha nas costas das mãos.
E, em ambas as mãos, o mesmo desenho de uma cobra engolindo o próprio rabo. Uma cobra com olhos vermelhos, faiscantes, expressão voraz e absolutamente privada de sentimentos. Puro instinto e ferocidade.  Tratava-se de um símbolo milenar, e Lúcio já havia esbarrado com ele algumas vezes. Era chamado de Uróboro.
O dono da loja apresentou-se como Mehmedi. Educadamente, como todo lojista em Istambul, insistiu que  Lúcio, mesmo que não lhe interessasse comprar nada, se sentasse nas almofadas, que cobriam um recanto da tenda, e tomasse chá com ele. Foi o que o jovem arqueólogo fez, colocando de lado sua mochila de lona.
Lúcio já havia recusado inúmeros daqueles convites,  de outros comerciantes do Grande Bazar, mas resolveu aceitar aquele. Justamente aquele.
- Não estou mesmo interessado em lâmpadas – lamentou Lúcio.
Mehmedi sorriu e serviu o chá numa taça. Lúcio aspirou o perfume do chá – era delicioso. Teve uma sensação de bem-estar absoluto, naquela tenda. E foi assim, relaxado, que conversou com Mehemedi. O comerciante fez questão de saber de onde ele era e o que  viera fazer na Turquia:
- Turismo... Explorações ... Estudo ... – respondeu Lúcio. – Um pouco cada.
- Ah, meu amigo. Então, o suk é o lugar certo. E se não vai mesmo comprar uma lâmpada, talvez eu possa lhe oferecer uma outra coisa.
Sem esperar a resposta de Lúcio, Mehemedi curvou-se sobre uma pequena mesa, bastante baixa, entre as almofadas – que Lúcio, bem mais tarde, consideraria que estivera ali, arrumada, aguardando somente a oportunidade certa. Ergueu então uma toalha de seda negra, sob a qual havia uma pequena caixa de madeira escura. Havia algo gravado em dourado na tampa, que, ao olhar de Lúcio, pareceu, à primeira vista, um “D”. Olhando melhor, reparou que a linha que formava a letra era o corpo de uma serpente que também engolia seu rabo, na base do “D”. Sentiu um calafrio e certa aversão àquela figura.
Mehemedi abriu a caixa, e dentro dela havia três dados de bronze.
Por todo o tempo, acompanhando os gestos de seu anfitrião, Lúcio ficara como que magnetizado pelas tatuagens nas mãos de Mehemedi, como se as serpentes também se movessem. Na hora, sorriu, desdenhando a ilusão, e tentou focar a vista. Mas, como se repelindo sua reação, sentiu uma pressão crescente nas têmporas, e seu coração começou a dar saltos repentinos.
- O que são? – perguntou Lúcio. As faces dos dados não tinham números, mas símbolos que ele desconhecia.
- Um jogo... – respondeu Mehemedi.
- E como se joga?
- Ah, sim, as regras. Estão perdidas. Ninguém mais as conhece. Quer pegá-los? – perguntou o comerciante, suspendendo a caixa na altura das mãos de Lúcio. – Veja como rolam na sua mão como se ganhassem vida.
Lúcio deu uma risada, acreditando que o lojista procurava intrigá-lo para  conseguir vender-lhe os dados. Apanhou-os  e os rolou de uma mão para outra. O ruído que faziam, ao se chocarem, lhe lembrou o guizo de uma cascavel.
-  Parecem bastante antigos... – observou Lúcio. – Devem valer muito.
- Fique com eles, meu amigo.  
- Minha nossa! Imagine se tenho dinheiro para algo assim.
- Um presente!
- Como? – surpreendeu-se Lúcio. Mas, logo recuperou-se. Pensou e replicou: - Não, não posso! – disse, devolvendo os dados à caixa. – Não devo aceitar um presente tão caro. Além do mais, parecem ser uma relíquia... Com valor arqueológico. São autênticos, não são?
- Únicos!
- Bem, as autoridades não vão permitir que saiam do país.
- Não creio que o jovem vai ser incomodado por isso ... – riu-se Mehemedi.
- Mesmo assim, não, obrigado – disse Lúcio, levantando-se.
- Pelo menos, veja o que mais tenho aqui na loja. Não quer um lenço de seda? Tenho pequenas bijuterias feitas de osso de camelo por um preço bastante razoável.
Acabou não comprando coisa alguma. Saiu apressado e sentiu-se melhor do lado de fora. Se bem que...
Na saída, estranhara algo, que passou de relance por seus olhos, mas só depois se deu conta do que era. Só depois, no hotel modesto onde se instalara, descobriu, dentro da sua mochila, a caixa de madeira preta, com o uróboro na tampa –  era mesmo uma preciosa gravação a ouro. Os três dados estavam ali dentro. Então, se deu conta do que o perturbara, quando se despediu de Mehemedi, apertando sua mão na saída da tenda. Ainda voltou ao Bazar, buscando pelo comerciante de lâmpadas, para lhe devolver a caixa e os dados, mas, enredado no labirinto de tendas, sem recordar ao certo as ruas que percorrera antes,  jamais conseguiu encontrá-lo.  
Pensou em entregar os objetos às autoridades, ou talvez ao Museu, mas teve receio das desconfianças, da conhecida brutalidade da polícia local, que não seguia o preceito de que uma pessoa é inocente até que se prove em contrário. Seria acusado de roubo, mesmo que fosse um ladrão arrependido, devolvendo as relíquias. E, o tempo todo, perseguiu-o a certeza de que, de todas as alternativas, a pior, a mais arriscada, a que pareceria mais criminosa foi a que escolheu. Sabia que seria atirado na cadeia – se fosse pego no aeroporto - sob a suspeita de ser um contrabandista de antiguidades, algo odiado em países como a Turquia, que tanto sofreram com pilhagens estrangeiras sobre seu patrimônio arqueológico. E sabia que ninguém se preocuparia com a formalidade de contatar a embaixada brasileira para informa-la da detenção. Ele simplesmente sumiria. Era o risco.
No entanto, fez o que fez, e talvez o tenha feito perturbado pela visão da mão de Mehemedi, de ambas as mãos, no momento em que deixou a tenda, e se na hora não entendeu o que o incomodara, horas depois, a visão se tornara evidente. As serpentes, os uróboros tatuados ... haviam desaparecido das costas das mãos dele.
Como se tivessem seguido os dados.